Pela defesa dos direitos digitais em Portugal




Comunicado de Imprensa

Associação D3 - Defesa dos Direitos Digitais
10 de Dezembro de 2020

A Associação D3 – Defesa dos Direitos Digitais apresentou hoje uma queixa à Comissão Nacional de Protecção de Dados relativa às práticas nocivas da indústria da publicidade comportamental (adtech).

Os sistemas de licitação em tempo real utilizados por esta indústria implicam a partilha de dados sensíveis de uma pessoa sem o seu consentimento, o que pode incluir o histórico de navegação pessoal com as suas preferências sexuais ou a sua localização recente, com centenas - se não milhares - de empresas na Internet. Essas empresas licitam então por esse espaço publicitário, e a licitação mais alta consegue colocar o seu anúncio à frente dos olhos dessa pessoa.

Esta iniciativa decorre hoje simultaneamente em 6 países [1], com a apresentação de queixas por parte de diversas organizações às respectivas autoridades de protecção de dados. Estas novas queixas vêm juntar-se às apresentadas em 15 outros países [2] da União Europeia, em 2018 e 2019, que exigiam investigações imediatas sobre os sistemas de licitação em tempo real, bem como a aplicação das leis de protecção de dados da U.E. Esta acção é coordenada por um consórcio composto pela Civil Liberties Union for Europe (Liberties), pela Open Rights Group (ORG) e pela Panoptykon Foundation.

Pela Civil Liberties Union for Europe (Liberties), a Dr. Orsolya Reich, senior advocacy officer afirmou:
"A licitação em tempo real, que é a base da indústria da publicidade online, é um abuso do direito das pessoas à privacidade. O RGPD está em vigor desde 2018 e existe precisamente para dar às pessoas uma maior influência sobre o que acontece aos seus dados online. Hoje, mais grupos da sociedade civil dizem basta a este modelo de publicidade invasivo e pedem às autoridades de protecção de dados que enfrentem as práticas nocivas e ilegais que utilizam".

O consórcio apela a todas as autoridades nacionais de protecção de dados interessadas para que considerem a questão da licitação em tempo real em uníssono, e para que se juntem à investigação conduzida pelas autoridades de controlo principais na Irlanda e na Bélgica.
Embora algumas das queixas de 2018 e 2019 tenham sido remetidas para as autoridades líderes, o consórcio não tem conhecimento de qualquer cooperação significativa ou operações conjuntas entre as autoridades nacionais e as autoridades líderes. Isto sugere que os mecanismos de cooperação e coerência previstos no RGPD ainda não foram plenamente implementados. É necessária uma investigação conjunta, uma vez que a licitação em tempo real funciona da mesma forma além fronteiras e produz os mesmos efeitos negativos em todos os estados membros da U.E.

Eduardo Santos, Presidente da D3, afirmou:
“O modelo actual de publicidade online, assente na vigilância dos internautas e extracção dos seus dados, consegue ao mesmo tempo ser incompatível com a protecção de dados pessoais e desempenhar um papel primordial na quebra de receita publicitária de que tantas publicações se queixam. A opção por este modelo em detrimento dos modelos clássicos de publicidade contextual, que valorizavam a reputação do meio e a qualidade e confiança da sua informação, levou a que reputados meios de comunicação social concorram hoje em dia no mesmo plano que sites pouco fidedignos, que procuram o click a todo o custo, por anunciantes que não se interessam onde aparecem os seus anúncios. A solução não é uma corrida para o fundo com esse tipo de sites. Todo o modelo tem de ser repensado.”

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Notas:

[1] As organizações e países envolvidos nesta iniciativa são:
1. Asociatia pentru Tehnologie si Internet (ApTi), Roménia
2. D3 - Defesa dos Direitos Digitais, Portugal
3. GONG, Croácia
4. Global Human Dignity Foundation, Malta
5. Homo Digitalis, Grécia
6. Institute of Information Cyprus, Chipre

[2] Os países onde foram já apresentadas queixas, em 2018 e 2019:
1. Bélgica
2. Bulgária
3. República Checa
4. Estónia
5. França
6. Alemanha
7. Hungria
8. Irlanda
9. Itália
10. Luxemburgo
11. Polónia
12. Espanha
13. Eslovénia
14. Países Baixos
15. Reino Unido